Confira a entrevista que gerou a matéria do No canto do Bar




Há alguns dias publicamos em nossa Fanpage uma matéria sobre a gente no site No Canto do Bar(a íntegra do texto também está nas notas da Fanpage). Como aqui você sempre fica por dentro das novidades mais quentes sobre a DB, disponibilizamos agora a entrevista que deu origem à matéria. As perguntas foram respondidas por mim em 1º de dezembro. Confira:

Vocês já tiveram oportunidade em tocar na capital baiana? Que comparações vocês podem fazer entre a cena musical de Salvador com a de Vitória da Conquista?
* Infelizmente não. Nós passamos todo o ano de 2011 sem baterista, tocando no formato Acoustic Alchemy na maioria dos shows, o que nos impossibilitou de se apresentar em vários lugares do Brasil. Por isso não tenho muita propriedade pra comparar as duas cenas. Aqui em Conquista, apesar de existirem muitas bandas independentes, é impossível se dedicar exclusivamente à música. Praticamente há apenas um lugar para shows(que fui um dos fundadores, no final de 2008), na maioria das vezes promovidos pelo Coletivo Suíça Bahiana. Estamos todos saturados disso, mas é aquela história: “ruim com isso, pior sem isso”. Os empresários da cidade ignoram a existência de música não-pornográfica-dançante. A impressão que tenho é que, guardadas as devidas proporções, nossa cena independente, tão agitada no início dos anos 2000, anda meio apática, perdendo até pra cidades menores, como Poções. A cena de SSA, apesar de tanto investimento na sotero-pornomusic me parece mais madura. As bandas autorais com gravações bem-feitas começaram a aparecer pra valer só há uns quatro anos aqui em VCA. Tirando a Cama de Jornal, que é referência nacional de punk rock, todas as outras ainda estão no primeiro CD, definindo seus estilos. É um processo natural na minha opinião, estarmos um pouco atrasados com relação à capital, mas pra uma cidade que adora se gabar que é berço de nomes como Elomar, Glauber Rocha, Glauber Rocha, Elomar, e mais uma dúzia de repetições, temos potencial pra fazer mais e não estamos com garra suficiente. Se você perguntar a outras pessoas, provavelmente vão dizer que a cena está ótima, que temos boas bandas autorais e tal. Mas por fazer parte do nascimento disso, bem nos primórdios da virada do milênio eu posso garantir que se fôssemos maduros como hoje e tivéssemos a garra dessa época já teríamos lançado ao menos uma banda pro mainstream nacional. A garotada que vai aos shows hoje (que não tinha idade pra ir nos shows dessa época, quando tínhamos dúzias de bandas de rock na cidade) provavelmente sequer imaginam como é a sensação de ter vários shows pra ir num mês e todos estarem lotados e não se ver nenhuma briga. Hoje não rola, até porque a cidade está violentíssima. Nós mesmos perdemos nosso ex-baixista em setembro, vítima de violência. Não dá mais pra ficar de bobeira por aí. Muita gente simplesmente desencantou e foi constituir uma família-padrão.


Na opinião de vocês, tocar em Salvador alavancaria a carreira da banda ou é possível se destacar fazendo um trabalho fora da capital?
* Não sei se “alavancaria”, mas estamos loucos pra tocar aí. Tocar na capital é um de nossos objetivos pra 2012, assim como fora do estado. Estamos finalmente fazendo um período de testes com um baterista e parece ter futuro. Não dá pra pegar violões, baixolão, banjo e cajón pra competir com guitarras elétricas, teclados, etc. Se tudo continuar dando certo, em 2012 já poderemos meter o pé na estrada, fazer shows e lançar o segundo CD. Lembrando que para o blues ainda é um pouco mais difícil que para o rock. Muita gente simplesmente não faz idéia do que seja isso, e quando ouvem lembram que são “aquelas músicas de striptease”, rs. Então pra gente também é de suma importância tocar em São Paulo, Rio, região sul e também no Ceará, Rio Grande do Norte e Pernambuco, onde a cena blueseira é mais consistente no nordeste. Pensando nisso não queremos nos fechar no circuito blueseiro, e sim fazer umas visitas lá, mas manter os pés na cena do rock independente, que é onde temos mais chances de passar nossa mensagem. Aceitamos convites pra shows, hein? Alou, agentes soteropolitanos!

Com os coletivos, podemos observar um crescimento maior de eventos independentes no interior do estado. Como é a organização e estruturação desse cenário em Vitória da Conquista?
* O coletivo de VCA é muito importante sim, e colaborou bastante pro crescimento de nossa cena, que estava no limbo desde 2006, por aí. Vejo que outras cidades, como Jequié e Feira também já têm seus Coletivos. Aqui em VCA ainda há algumas coisas pra se melhorar, o que mais falta é o profissionalismo, de forma mais rígida e abrangente do termo. Pelo que ouço falar dos Coletivos em São Paulo, são bastante diferentes do daqui em vários aspectos que não caberiam expor ao público, mas se pudesse resumir em uma palavra o que mais deveria melhorar, tanto em relação ao Coletivo quanto aos próprios músicos contratados, de banda, pessoal de apoio, etc. de uma maneira geral, seria profissionalismo. Sinto muita falta disso por aqui.

Ser uma banda baiana que não toca axé, infelizmente ainda surpreende quem é de fora. Vocês acreditam que isso tem certo peso na trajetória da banda? Como o público local recebe essa proposta de vocês em tocar blues?
* Quando o Roberto Terremoto, produtor da coletânea Máfia da Mortadela – Coletânea Brasileira de Blues, onde fomos a única banda de fora do eixo Rio-São Paulo a participar (com Luar do Pontal) foi a Fortaleza (ou Natal, não lembro bem) divulgar o CD numa rádio e falou da gente, o locutor perguntou: “Ué, e tem blues na Bahia?” Na mesma hora pensei que se os caras de New Orleans pensassem sobre o blues no Brasil (seja lá em qual estado fosse) pensariam o mesmo e ainda dariam risada do tal brazilian blues. Pois é, tem blues na Bahia sim, e pior: no interior! São os estereótipos, não dá pra fugir deles. O Axé-Music virou o rótulo do estado e infelizmente temos que esbarrar nele sempre. Mas é até divertido ver um cara do Paraná ter o mesmo espanto. Isso pode até nos ajudar sim. É como se fosse um atestado de bravura, onde nadamos com os pés amarrados contra a grande correnteza que é o Axé. Há algumas semanas fizemos uma entrevista pra uma emissora de TV e gravamos duas músicas pra usarem na reportagem. Depois da brevíssima entrevista passou 1 segundo da gente tocando (não estou exagerando) e depois rolou dois blocos com uma banda de axé ao vivo no estúdio, contando toda a sua história, tocando seus sucessos, etc. Este é o real retrato de como a mídia encara a “tão vasta” musicalidade baiana. Do que reclamar se quem é de outro estado pensar que não existimos? Até eu fico na dúvida às vezes, rs.

Em 2011, foi lançado o primeiro trabalho da banda, o EP Aplicando a Lei. Como foi o processo de produção e gravação dessas canções?
* Essas músicas foram gravadas separadamente entre o início de 2010 e o início de 2011. Luar do Pontal foi a primeira e logo de cara entrou na coletânea da Máfia, que citei acima. Depois vieram as outras e cada uma (exceto Blues do Covarde e De Cara no Blues, que foram gravadas juntas) foi produzida num momento diferente, com formações distintas e tal. Foi um trabalho feito com muito cuidado e zelo, mas é introdutório, ainda não dá pra definir nosso estilo só pelo EP. As músicas do segundo CD, que já tem título definido e algumas faixas já são executadas em shows possuem um pouco daquela atmosfera, mas já mostrarão uma DB um pouco diferente. O EP foi lançado num programa de rádio voltado pro cenário independente, O Som da Tribo, que dá uma força indispensável pra todas as bandas há mais de 15 anos. Como estávamos sem baterista e ainda não existia o formato Acoustic Alchemy (voz-violão-violão-banjo-baixolão-cajón) não fizemos show. Em compensação tratamos de caprichar nos detalhes: são 110 cópias numeradas e cada uma com conteúdo exclusivo. Por exemplo, tiramos umas trezentas fotos pra escolher as 110 que iriam pra faixa multimídia de cada CD. Se você tiver um aí em mãos pode ter certeza que é único e ninguém tem um igual. Não são meras cópias. Claro que tudo foi feito de forma artesanal, pra ficar do jeito certo e cortar gastos, já que grana é o que mais falta pra todos que se metem nessa jornada. Então ainda vai um adesivo de brinde e todos são mini-CDs, daqueles que cabem na palma da mão. Em nosso site tá saindo uma série de posts sobre os bastidores da fabricação deles, é só acessar. O pessoal tem gostado, já toca em várias rádios Brasil afora. Enfim, é uma pequena amostra do que vem por aí. Temos muito orgulho desse EP. Eu ouço várias vezes por semana desde o lançamento. É como um filho, não dá pra enjoar dele.

Em outubro deste ano vocês se apresentaram no Festival Suíça Bahiana, um evento de grande porte que já vem acontecendo há bastante tempo. Qual a importância desse festival para a cena de Vitória da Conquista?
* Esse festival é importantíssimo pra cena conquistense, uma forma de resgatar os tempos que já falei, do início dos anos 2000, onde tivemos três edições de um festival desse tipo, o Agosto de Rock, além do Rock Vertente, que tocamos quando éramos uma banda de rock setentista, a The New Old Jam. Mais recentemente (talvez em 2006) teve o Acrock, que também participamos. Como falei, essa nova geração ainda não tinha essa experiência e pra muitos foi o primeiro festival de suas vidas. Pras bandas locais foi interessante tocar numa estrutura de palco consistente e de boa qualidade. Fizemos muitos contatos com bandas de outros estados, como Paraná e Rio Grande do Norte. Mas, como disse também acima, ainda falta um pouco de profissionalismo e bom-senso. Quase todas as bandas locais se sentiram prejudicadas de alguma forma em fatores básicos. Claro que o público não precisa e nem deve se preocupar com isso, mas olhando daqui dos bastidores eu diria que o Lobão falaria muita coisa se fosse conquistense.

A banda lançou uma zine, chamada BLUEZinada!, um meio de divulgação muito utilizado nas décadas de 80 e 90 pelas bandas do estado. Por que vocês resolveram trazer de volta um instrumento já esquecido, por conta da internet?
* Não acho que esteja esquecido. É o mesmo que acontece com o vinil: no Brasil se fala que o vinil morreu, mas na Europa ele não só nunca desapareceu, como é mais forte que o CD. Com as zines é o mesmo. Sempre foram um instrumento alternativo, surgido na década de 30 nos EUA e popularizado principalmente pelos punks no final dos anos 70. Aqui em VCA existem pessoas que fazem zines regularmente, imagino que aí em SSA também role. Em São Paulo existem eventos só sobre zines, nos EUA e Europa mais ainda. A nossa é uma mini-zine (talvez pra combinar com o mini-CD) de oito páginas, com bastante informação sobre blues e jazz, incluindo dicas de livros, filmes, discos, matérias, letras de músicas comentadas, HQ, resenhas sobre outras bandas nacionais e, claro, informações sobre a DB. Distribuímos a BLUEZinada! Gratuitamente em shows, deixamos em pontos culturais, enviamos junto com os CDs comprados pela internet, enfim, é uma forma que encontramos de contribuir com a formação de público pro blues e jazz, especialmente nacionais. Escolhemos fazer num formato mini pra evitar que as pessoas joguem fora nos shows, já que por caber no bolso sem amassar as pessoas acabam levando pra casa. Lançamos no Festival Suíça Bahiana (onde havia outra zine circulando, do pessoal do punk rock) e só encontramos UMA zine no chão. Sinal que funcionou e isso nos deixa muito contentes. Esse lance da formação de público é muito importante pra gente: três dos integrantes são ligados à educação (eu sou licenciado em história, Camilo cursa licenciatura em Biologia e Rômulo cursa Pedagogia), então temos a plena consciência de que o artista, por ser um formador de opinião, tem a obrigação de contribuir com a sociedade de forma construtiva. Então a zine é uma das formas que encontramos pra fazer isso. Não há uma periodicidade fixa (lançaremos o volume 2 quando der na telha), mas a mensagem é passada. Rola uma informação cuidadosamente escrita, que contribui pra alguma coisa, mesmo que de forma bem tímida. Fazemos o mesmo em nosso site: divulgamos outras bandas(todos os dias divulgamos shows de blues ou jazz por todo o Brasil, muitas vezes sem nunca ter conversado com os músicos), resenhamos livros, filmes, discos, publicamos notícias, podcasts, além, é claro, de campanhas para doação de órgãos, adoção e proteção aos direitos dos animais, etc. Por isso me irrita muito ver pornomúsicos tirarem onda de artistas conscientes e responsáveis nos programas de TV. Acho muito contraditório vender um produto essencialmente vulgar e depois dizer que se importa com as crianças. Se esse tipo de artista representa a música baiana eu prefiro não me considerar baiano, sinceramente.

Qual o papel da internet na carreira de vocês?
* A internet é indispensável pra qualquer artista independente. Sem ela teríamos de ficar sempre naquela ilusão de que um dia um olheiro de uma grande gravadora nos descobriria e então ficaríamos famosos. Hoje o mundo da música está mais justo, em minha opinião. Se você é um bom compositor, bom músico e corre atrás do seu sonho, você consegue passar sua mensagem. Aos poucos, mas consegue. Tem gente de todas as partes do mundo acessando nosso site, ouvindo nossas (poucas, mas sinceras) músicas. Algumas bandas quando fazem muito sucesso na internet conseguem ser acolhidos pela Grande Mídia, mas sinceramente, não precisamos mais dela. Hoje podemos fazer nossas músicas do jeito que queremos, sem precisar fazer adaptações para o mercado. Se for legal é inevitável que terá pessoas pra ouvir e recomendar. E outra coisa bem interessante é que os consagrados não são mais semideuses, já é possível até bater um papo em tempo real com eles, pelo Twitter, ou outra forma. Por exemplo, certa vez pedimos ao Leoni pra tocarmos a música Os Amadores, de seu último disco em nossos shows e ele deixou. Como isso seria possível nos anos 90? É só um dos milhares de exemplos que podemos pensar.

É possível viver exclusivamente de música na Bahia fazendo um som independente? Vocês exercem profissões paralelas?
* NÃO! Quer dizer... Sem turnês em outras cidades não. É o que mais sentimos pesar em 2011 e é a principal meta pra 2012 juntamente com a gravação do segundo CD. Quando os discos surgiram, começaram a servir como incentivos pra que as pessoas fossem aos shows dos artistas, que ganhavam centavos por seus fonogramas. Depois, com a industrialização pesada, lucrava-se enormemente com a venda dos discos. Hoje voltamos à lógica de que o disco é só uma amostra do que o artista é capaz de fazer no palco. Claro que o fonograma também deve ter seu valor, pois geralmente exige muito trabalho e dedicação, além de ser a banda num formato portátil. Mas o que diretamente leva o pão à mesa do artista hoje são os shows. Os discos e fonogramas separados são importantíssimos, mas não sustentam financeiramente ninguém hoje em dia. Todos nós temos outras profissões, mas o que mais desejamos é viver daquilo que mais amamos, que é a música. E estamos tentando.

Os artistas independentes costumam fazer a sua própria gestão. Então, como é a organização da banda? O que fica a cargo de quem?
* Nos primórdios da DB aconteceu de cada um ir pro seu lado e eu ficar sozinho com o nome da banda e a decisão de seguir em frente ou não. Escolhi a primeira opção e fui à caça de novos integrantes, então acabei acumulando várias funções, desde a missão de encontrar os músicos certos até a criação do site, dos perfis nas redes sociais, a produção nas gravações, etc. Então até hoje a maioria das coisas são feitas por mim. Os outros membros, claro, têm autonomia pra marcar shows, definir valor de cachê, arranjar as músicas, colocar suas composições no repertório e tal, mas a parte burocrática e administrativa fica por minha conta mesmo, até pela experiência que tive como microempresário e mesmo nesse período solo da DB. Aprendi muita coisa na marra que hoje é fundamental pra banda. Também tem a Ester Barreto, que é nossa assessora de comunicação, além de um monte de outras coisas. Ela é a melhor de todos nós pra conseguir contatos, mostrar nosso material pra pessoas estrategicamente interessantes e tudo mais. No fim das contas cada um faz o que está ao seu alcance e assim a coisa anda, mesmo que aos poucos. É como deve ser, afinal.