A data é 11 de agosto de 1938. Na cidade de Greenwood, no estado do Mississipi, o povo aguarda a presença do homem que dizem ter vendido sua alma ao diabo. O ruído do trem aumenta conforme ele se aproxima da estação. A antecipação de alguns moradores acompanha o volume do barulho que ressoa do trem.
Muitos temem a presença deste homem, muitos admiram a sua música. Algo estranho paira no ar, enquanto pessoas aguardam a chegada do homem misterioso na própria estação de trem. Um último suspiro vindo dos freios do trem marca a parada total nos trilhos. Jovens, adultos, homens e mulheres desembarcam na cidade. Porém, aquele que era aguardado com temor de uns e admiração de outros não desceu de nenhum dos vagões.
O bar “Three Forks” já anunciou o concerto deste artista “infernal”. Ao passear pela rua é possível ouvir alguns comentando: “ele toca de costas para o público, para não mostrar o olhar demoníaco que surge para ajudá-lo”. Muito é dito, boatos são contagiosos como a gripe, mas a única certeza que todos tinham é que o gaitista Sonny Boy Williamson acompanhará o artista que dizem ser associado a Lúcifer.
O trem que deveria trazê-lo já chegou, todos desembarcaram, mas o guitarrista não desceu. Este fato fez grande parte da população local imaginar diversas histórias do que poderia ter ocorrido: “Será que o demônio finalmente cobrou sua dívida?”
Apenas o jovem Sonny sabia o paradeiro dele, mas resolveu não contar a ninguém. Todo aquele alarde foi dando visibilidade ao show, enquanto todos imaginavam quando o guitarrista chegaria, ele se escondia na cama de uma mulher casada na parte sul da cidade.
Em poucos dias, eles tocariam no bar Three Forks e com tantos boatos sobre o bluesman, que gravara algumas músicas em 1936 e 1937, o show ficaria lotado. Estas canções teriam sido gravadas com um dom oferecido a ele diretamente pelo Satanás, em uma encruzilhada da Highway 61 com a Highway 49. Ele portava seu violão, esperou até um pouco antes da meia-noite. Quando o relógio ficou com os ponteiros juntos no número 12, o Diabo surgiu e tocou-lhe o ombro. Ele sabia que era importante não olhar para o Demônio, que pegou seu violão, tocou algumas músicas e devolveu o instrumento. Com este simples gesto o acordo foi feito.
Finalmente chegou o dia do concerto e muitos da cidade estão animados, muitos estão apavorados e todos aguardam por algo diferente. O bar está lotado, Sonny aguarda a presença do polêmico guitarrista olhando para as pessoas presentes no Three Forks. Sua atenção está em um homem de aparência bruta, suado e com cara de poucos amigos. Aquele homem não lhe é estranho.
Robert Johnson entra no bar, segurando seu violão na mão esquerda. Ele pede um uísque para o barman e olha ao redor. Rapidamente percebeu que o olhar de todos está voltado para o bar de madeira antiga onde está sentado. Ele termina seu uísque e chama seu amigo Sonny Boy Willamson para começar a tocar.
Após três músicas, Sonny repara que aquele homem de aparência bruta, que chamou sua atenção antes do show, despejou algo na bebida de Robert e tenta avisá-lo. Porém, Johnson não lhe dá ouvidos e toma o drink envenenado.
Três dias depois da intoxicação descobriram que o homem que o envenenou era marido da mulher que Robert dormiu alguns dias antes da apresentação. Johnson se recuperou do envenenamento, mas com o corpo debilitado acabou falecendo de uma pneumonia. Era o fim do mestre do blues que diziam ter vendido a alma ao Belzebú.

Luciano Bonagura

Jornalista, crítico musical, percussionista e amante de uma cerveja bem gelada com os amigos no bar. Usa da razão e da paixão para apreciar uma boa música e transcrever seu significado.

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