Blues da Piedade, top 3 dos "semiblues" mais manjados da MPB
Whoa! Cá estamos. Agora vamos falar sobre o blues enxertado na chamada MPB, que até hoje não é muito bem-definida(e nem deveria ser, na minha opinião). Costuma-se chamar de MPB os artistas consagrados e reconhecidos por boa qualidade: quando alguém diz "ah, eu gosto de MPB" significa que ela está dizendo que gosta de boa música, mesmo que não goste realmente. Algumas décadas atrás, MPB era sinônimo de música genuinamente brasileira, o oposto aos hereges roqueiros, por exemplo. Bem, esse negócio de rotular é sempre complicado. O Cazuza, por exemplo, é um artista que eu já vi várias vezes nas prateleiras de MPB e de rock. Na verdade nem ele mesmo sabia bem o que era e, em minha opinião, rotular só limita o artista. Então, MPB neste e nos próximos posts com esse título se referem a artistas consagrados, seja um Raul Seixas ou Elis Regina. E pra facilitar ainda mais, são artistas que não são do blues(só 99,99% dos músicos consagrados no Brasil).
É interessante como, nos barzinhos da vida, onde exaustivas e maçantes versões de Chão de Giz, Telegrama, Oceano, Chega de Saudade são executadas volta e meia alguém inventa de pedir, ou mesmo inventa de tocar blues, pra tirar uma onda. O cara faz aquela pose de músico-pesquisador, anuncia que vai tocar um blues e... Dá-lhe Blues da Piedade! Existem outras que não ficam muito atrás, mas não vou estragar a surpresa dos próximos posts(você pode sugerir canções também, lá embaixo, em comentários). Não sei no estado onde você mora, mas aqui na Bahia já cansei de ver essa cena. O cara destrói minha esperança de ouvir um clássico do blues terminando, na maioria das vezes mal, a música da dupla Frejat & Cazuza. Aplausos. Isto é blues na Bahia.
Nada contra, eu particularmente adoro a música, isso é só mágoa de um blueseiro que vive no ninho do Axé. Muitos artistas da MPB se aventuraram na agradável e não tão fácil tarefa de fazer alguns acordes com sétima seguidos de um bom feeling do Mississipi. Algumas músicas ficaram brilhantes, mesmo sendo executadas e compostas por um suposto leigo, outras soaram estranhas. O fato é que sempre houveram manifestações blueseiras no Brasil, desde a década de 60 até hoje. Pena que foram quase sempre exceções experimentais.
Cazuza e Frejat sempre tiveram uma queda pro blues. Desde o começo do Barão fizeram músicas com um toque blueseiro, como Down em Mim, Mais Uma Dose, Bilhetinho Azul, etc. O que eu acho mais interessante é que eles não tentaram, como muitas bandas de blues brasileiras fazem, criar blues americano em português. O blues americano é ótimo, mas pra quem vive no Brasil e é ligado em música como eu, considera a grande maioria das letras fraquíssima. Mas isso acontece com o rock também. Muitas músicas que eu adoro me decepcionaram quando fui ver a tradução. Então acontece muito de os blueseiros brazucas simplesmente traduzirem pro português as temáticas e estilo de poesia americanos. É só a minha opinião, mas considero os americanos fraquíssimos no quesito letra. É o mesmo que acontece com o (argh) rap: os caras simplesmente imitam o estilo de se vestir, as gírias, aquele movimento característico das mãos, o boné virado e fazem rap americano em português. Daí vêm os pernambucanos e criam o Mangue Beat, que é um rap totalmente contextualizado à sua realidade. Isso eu considero uma evolução no gênero.
Então a coisa se inverte: de um semiblues executado por leigos, a música vira um blues brasileiríssimo. Blues da Piedade é o exemplo deste post. Une o blues ao universo brasileiro, sem tentar fazer cópias. Tudo questão de ponto de vista. Essa música foi lançada no álbum Ideologia, um ótimo disco lançado em 1988, logo após o Cazuza descobrir que estava com AIDS. A foto acima encontra-se na capa traseira do LP e já dá uma boa situada na fase em que o poeta estava. Pouco tempo depois morreria de um choque séptico e arrastaria centenas de pessoas até o cemitério São João Batista, no Rio.
Confira abaixo a ótima letra e a ficha técnica da versão em estúdio original da música:
É interessante como, nos barzinhos da vida, onde exaustivas e maçantes versões de Chão de Giz, Telegrama, Oceano, Chega de Saudade são executadas volta e meia alguém inventa de pedir, ou mesmo inventa de tocar blues, pra tirar uma onda. O cara faz aquela pose de músico-pesquisador, anuncia que vai tocar um blues e... Dá-lhe Blues da Piedade! Existem outras que não ficam muito atrás, mas não vou estragar a surpresa dos próximos posts(você pode sugerir canções também, lá embaixo, em comentários). Não sei no estado onde você mora, mas aqui na Bahia já cansei de ver essa cena. O cara destrói minha esperança de ouvir um clássico do blues terminando, na maioria das vezes mal, a música da dupla Frejat & Cazuza. Aplausos. Isto é blues na Bahia.
Nada contra, eu particularmente adoro a música, isso é só mágoa de um blueseiro que vive no ninho do Axé. Muitos artistas da MPB se aventuraram na agradável e não tão fácil tarefa de fazer alguns acordes com sétima seguidos de um bom feeling do Mississipi. Algumas músicas ficaram brilhantes, mesmo sendo executadas e compostas por um suposto leigo, outras soaram estranhas. O fato é que sempre houveram manifestações blueseiras no Brasil, desde a década de 60 até hoje. Pena que foram quase sempre exceções experimentais.
Cazuza e Frejat sempre tiveram uma queda pro blues. Desde o começo do Barão fizeram músicas com um toque blueseiro, como Down em Mim, Mais Uma Dose, Bilhetinho Azul, etc. O que eu acho mais interessante é que eles não tentaram, como muitas bandas de blues brasileiras fazem, criar blues americano em português. O blues americano é ótimo, mas pra quem vive no Brasil e é ligado em música como eu, considera a grande maioria das letras fraquíssima. Mas isso acontece com o rock também. Muitas músicas que eu adoro me decepcionaram quando fui ver a tradução. Então acontece muito de os blueseiros brazucas simplesmente traduzirem pro português as temáticas e estilo de poesia americanos. É só a minha opinião, mas considero os americanos fraquíssimos no quesito letra. É o mesmo que acontece com o (argh) rap: os caras simplesmente imitam o estilo de se vestir, as gírias, aquele movimento característico das mãos, o boné virado e fazem rap americano em português. Daí vêm os pernambucanos e criam o Mangue Beat, que é um rap totalmente contextualizado à sua realidade. Isso eu considero uma evolução no gênero.
Então a coisa se inverte: de um semiblues executado por leigos, a música vira um blues brasileiríssimo. Blues da Piedade é o exemplo deste post. Une o blues ao universo brasileiro, sem tentar fazer cópias. Tudo questão de ponto de vista. Essa música foi lançada no álbum Ideologia, um ótimo disco lançado em 1988, logo após o Cazuza descobrir que estava com AIDS. A foto acima encontra-se na capa traseira do LP e já dá uma boa situada na fase em que o poeta estava. Pouco tempo depois morreria de um choque séptico e arrastaria centenas de pessoas até o cemitério São João Batista, no Rio.
Confira abaixo a ótima letra e a ficha técnica da versão em estúdio original da música:
"Agora eu vou cantar pros miseráveis
Que vagam pelo mundo derrotados
Pra essas sementes mal plantadas
Que já nascem com cara de abortadas
Pras pessoas de alma bem pequena
Remoendo pequenos problemas
Querendo sempre aquilo que não têm
Pra quem vê a luz
Mas não ilumina suas minicertezas
Vive contando dinheiro
E não muda quando é lua cheia
Pra quem não sabe amar
Fica esperando
Alguém que caiba no seu sonho
Como varizes que vão aumentando
Como insetos em volta da lâmpada
Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Pra essa gente careta e covarde
Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Lhes dê grandeza e um pouco de coragem
Quero cantar só para as pessoas fracas
Que tão no mundo e perderam a viagem
Quero cantar o blues
Com o pastor e o bumbo na praça
Vamos pedir piedade
Pois há um incêndio sob a chuva rala
Somos iguais em desgraça
Vamos cantar o blues da piedade
Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Pra essa gente careta e covarde
Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Lhes dê grandeza e um pouco de coragem"
FICHA TÉCNICA(gravação original)
Composição: Frejat, Cazuza
Voz: Cazuza
Vocais: Sandra Sá, Regininha e Jussara
Guitarra: Roberto Frejat
Baixo: Nilo Romero
Bateria: Sérgio Della Mônica
Piano e Harmmond: William Magalhães
Arranjo: Coletivo
Álbum/ano de lançamento: Ideologia/1988
Produção Executiva e Coordenação Geral: Márcia Alvarez
Mixagem: Márcio Gama e Julinho(Polygram)
Particularmente acho que o blues no Brasil ainda está engatinhando, se compararmos ao seu filho rock. Ainda estamos em busca de uma identidade sólida, não temos ainda os poetas do blues e a maioria dos vocalistas são guitarristas ou gaitistas que cantam. Ao contrário do rock, acredito que o blues brasileiro só tem a melhorar. Por enquanto os grandes poetas do blues nacional não são necessariamente blueseiros, como o Cazuza, mas tenho esperança de que a época de ouro ainda está pra chegar. Teremos blues falando de outras coisas além de mulheres e bebida. Nada contra, mais uma vez. Eu ouço, busco e gosto do blues nacional. Só tenho a sensação de que pode ser bem maior do que já é. Só espero que seja verdade. Abaixo, um vídeo do cazuza no Canecão, no mesmo período de lançamento do álbum. O cara realmente era bom. Fico por aqui. Até o próximo post. Deixe seu comentário logo abaixo e fique à vontade pra sugerir músicas pra esse tema.
I. Malforea
Cazuza - Blues da Piedade - Canecão 1988 - Rio de Janeiro
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