Seja para uma simples demo, seja para um CD, gravar o som da gaita tem seus truques. Neste bate-papo, Edu Gomes, dono da Estúdio Cakewalking Studios e guitarrista da Irmandade do Blues fala sobre o assunto, entre outras coisas.

Seu histórico como músico é invejável: começou na guitarra aos 7 anos e hoje pode elencar nomes como Abdré Christovan, Eddie C. Campbell, J. J. Jackson, Phil Guy, Greg Wilson, Marva Wright, Roberto Menescal, Andreas Kisser entre tantos outros com quem já tocou.

Também trabalhou como técnico de som e produtor por um bom tempo com Alexandre Fontanetti , produzindo artistas de varios gêneros, o que lhe serviu de base pra me iniciar o estúdio de gravação Cakewalking Studios. Dentro do Blues já produziu Clara Ghimel ( 2 CDs) , os Endorsees Bends Marcio Maresia, Marcelo Naves e Ivan Marcio, Cracker Blues, e co-produzi os CDs da Irmandade, e Adriano Grineberg Quarteto.

Por que a opção pela guitarra e pelo blues?
Foi o instrumento que maisme cativou mais na época que morava nos EUA, durante a época de ouro dos anos 70.
O Blues, conheci mais a fundo já no Brasil ao gravar ao lado de André Christovam, no CD Black Coffee da banda Big Alambik.Primórdios da Irmandade do Blues...
Estudei, Jazz, MPB e, é claro, o bom e velho Rock’n’Roll, mas foi o Blues que juntou tudo e resolveu minha vida, pois preencheu aquela lacuna do feeling tão característico dele e que acabou me trazendo personalidade ao tocar.

O que muda para o guitarrista tocar junto com gaitistas?
A guitarra é um instrumento de harmonia e melodia e a gaita de melodia, basicamente. Portanto, é preciso ser mais democrático e dividir esse espaço com o gaitista. Havendo coerência, cria-se uma mistura muito interessante.

O que a gaita acrescenta ao som de uma banda, do ponto de vista do guitarrista?
Ela pode ser uma alternativa a mais para a banda, como timbre. Desta forma ,pode oferecer mais alternativas para enriquecer a canção. Mas desde que haja sempre respeito à canção em si, que tem que predominar sempre. Competição jamais! Música não é esporte.

Quais as diferenças entre acompanhar o Vasco Faé e o Márcio Maresia, dois Endorsees Bends com quem costuma tocar?
São dois músicos distintos, com suas personalidades marcantes. Quando um músico só foca no seu instrumento, seja qual for, é inevitável que se torne chato, pois dificilmente toca pra a música e sim para sí. Isso pra mim é anti-música.
Tanto o Vasco como o Maresia são pessoas que focam na música ,através da experiência de vida em geral, o que obviamente inclui as influências.
Os dois ouvem de tudo. Mesmo que você vá tocar só Blues, faz uma grande diferença. Todos os grandes músicos com os quais já toquei possuem esse foco especial: tocar pra musica com humildade e respeito, assim como com os músicos companheiros e o publico.

Em relação à gravação, como tirar todo o potencial da gaita na hora de gravar? Existe técnica especial?
Pra mim, gravação se resume principalmente num foco: grandes gravações se fazem de grandes momentos, acima de grandes equipamentos. Um bom amplificador, instrumento, microfone, sala, técnico, etc, são cruciais, é claro.Mas sem astral, já era!
Portanto, procuro acima de tudo deixar a pessoa à vontade e feliz. Pronto...já temos um grande passo para um grande gravação!

O que os gaitistas devem fazer para tirar o máximo do instrumento durante as gravações? De modo geral, eles conhecem isso?
Sempre digo que show é show e gravação é gravação. São 2 mundos diferentes. A experiência vale muito. Por isso sempre falo para as bandas/músicos estarem gravando com constância, mesmo que uma demo, o que traz essa experiência.

Estar com a música na mão é essencial também, tanto na parte musical como de instrumento. Saber de verdade o que se esta fazendo.

De modo geral vejo que muito músicos (não só gaitistas) se preocupam demais com a parte técnica do instrumento e equipamento e não com a música. Ambos tem que andar juntos. Se for necessário escolher um, fico com a emoção e música ao invés de tecnologia.

Entrar no mundo da gravação seria pra mim a graduação de um músico. Ele aprende tudo. Como arranjar, como fazer dinâmica para um companheiro que está no seu momento de evidência, tocar mais baixo, o que facilita a harmonia de frequências num ambiente....
Daí a expressão em inglês: Play loud is NOT to play hard! Tem todo um jeito pra se fazer isso, e a gravação ajuda muito.

Existe algum porém em relação à tom ou timbre de gaita na hora de gravar?
Quando gravei o CD Blues Brasileiro do Maresia, insisti pra que ele gravasse o máximo possível com gaita limpa, pois na minha opinião é o timbre mais bonito e característico do instrumento. Adoro os harmônicos.

Gosto também de gaita em amp de guitarra com saturação -mas como um acessório a mais e com pouco "drive", pois do contrario quase sempre briga com a guitarra e fica difícil de mixar, pois se fundem um pouco. No CD do Maresia usamos gaita em amp Fender Deluxe limpo. Fica muito bom também , pois uma vez a Irmandade abriu o show do Charlie Musselwhite (1996) e ele usou meu Blues Deville limpinho com um SM58 e nunca me esqueci disso. Um dos maiores shows que já vi!

Você prefere gravar todo mundo junto (estilo ao vivo) ou cada instrumento separado? Quais as vantagens de cada opção?
Na minha opinião, o certo é gravar ao vivo, pois essa é a forma ideal para se fazer música. Sempre sai com mais emoção, e música sem emoção não é musica!

Existem porém 2 fatores principais que dificultam: o primeiro são as condições técnicas. Quase sempre ficam a dever pois é preciso um estúdio muito grande para haver mais espaço entre os músicos, evitando assim muitos vazamentos. Estúdio grande é igual a orçamento grande!
O maior problema pra mim, na verdade, é que a grande maioria dos músicos não chega preparada para isso. Basta um errar feio que compromete o take. Por isso gravo na maioria das vezes a cozinha valendo, apesar de todos estarem tocando juntos para se ter a “vibe” do ao vivo e na sequência faço os overdubs. O que recomendo nesse caso é a banda e o produtor fazerem um pré produção bem cuidada pra que desta forma o músico se sinta totalmente à vontade para fazer o take ao vivo.
A gravação em separado pode fazer com que você vá desenvolvendo idéias ainda não concebidas. Se o músico tiver muita experiência, é possível gravar em separado e soar ao vivo. Como sempre deve usar formula em que a MÚSICA seja prioridade. Se ela fica melhor com a banda ao vivo, gravo assim, senão do contrario.

Esta a minha análise com relação ao Blues e estilos derivados como R&B, Rock etc. Pop costuma ser diferente pois tem toda aquela produção, etc.

Fonte: Bends